Por que a escolha?

Enquanto um país inteiro adormece sob o feitiço das personalidades de Hitler e Mussolini e é coberto pelo manto do fascismo, um homem permanece acordado. Um homem que dialoga com os sonolentos, tentando passar despercebido, procurando um pouco de contato e aconchego. Por sorte, Gabriele entra em contato com Antonietta, cujo pássaro tinha fugido. Essa desculpa, e metáfora profunda, reúne esses dois seres que anseiam por conexão e companhia. Assim começa a se desenvolver uma amizade com bordas porosas.

Em Um dia muito especial, Ettore Scola explora os efeitos traumáticos do fascismo nas suas vítimas silenciosas. Seus personagens vivem em carne própria o isolamento, a miséria e a repressão do contexto que lhes é imposto com violência incisiva. Os discursos, as marchas militares e os cantos do público soam como ecos constantes. Não nos permitem esquecer o clima onipresente de opressão que coexiste com a alegria e a ilusão que o fascismo desperta.

Nesse contexto, a masculinidade tem regras rígidas. Os únicos papéis do homem são os de marido, pai ou soldado, e quem não os acatar sofrerá as consequências. Isolamento, demissões injustificadas, humilhações, desaparecimentos forçados são alguns dos castigos sociais para quem não se enquadra nessas normas. Gabriele não pode fugir de sua essência e, por mais que queira negar, é um homem homossexual. As mulheres, por outro lado, também estão sujeitas a regras de conduta rigorosas. Antonietta é o epítome da mulher perfeita para o fascismo. Ela mora em um cortiço, tem muitos filhos e um marido violento e ausente. Ela é a responsável por todas as tarefas de cuidado e manutenção da casa, sua infelicidade é palpável.

A luta desses oprimidos encontra um ponto em comum, e Antonietta e Gabriele aliam-se como cidadãos de segunda classe. Forçados a permanecer em silêncio e a serem considerados subumanos pelo resto da sociedade, unidos pela dor, pelas projeções e pelo desespero, eles encontram alívio temporário no encontro, mesmo que tenham que voltar rapidamente ao seu tormento e fingir que tudo continua igual.