Por que a escolha?

Como em muitos de seus filmes, o último trabalho de Kenji Mizoguchi, Rua da Vergonha, também se concentra nas dificuldades das mulheres japonesas durante a Segunda Guerra Mundial. Em meados da década de 1950, com o fim da ocupação americana, em Yoshiwara, distrito da luz vermelha de Tóquio, as mulheres do Dreamland, um dos prostíbulos mais conhecidos da região, veem seus empregos em risco porque o Parlamento está discutindo uma lei para proibir a prostituição.

Com esse contexto como pano de fundo, o filme aborda a profundidade psíquica e emocional de cada uma dessas mulheres, a dependência e a submissão, as cicatrizes ainda abertas deixadas pela guerra, a pobreza, a marginalização e os rígidos padrões morais que funcionam como cordas cada vez mais apertadas no pescoço da sociedade em geral. As promessas da lei anti-prostituição são vazias, as mulheres do Dreamland não terão alternativas de trabalho, nem moradia ou proteção do Estado. E, diante de todas essas carências, o dono do bordel finge funcionar como um assistente social que as protege e lhes garante moradia e salário, mas seus ares grandiosos são rapidamente ignorados. Elas sabem que são elas, e somente elas, que vão poder garantir a salvação. Atormentadas por fianças, despesas médicas, remédios e dívidas recorrem a todo tipo de manipulação e de estratégias para enganar os clientes, as lojas dos arredores, e entre elas mesmas, para conseguir dinheiro de onde for. Mas as dívidas e os enganos arrastam todos os personagens para a miséria e a opressão. Além disso, suas famílias, que prezam a honra e procuram corrigir qualquer desvio, acabam abandonando-as e excluindo-as.

Complexificando e expondo todas as contradições presentes, Kenji Mizoguchi, adaptando o romance Susaki no Onna, de Yoshiko Shibaki, cria uma história contundente que, longe de se posicionar diante da encruzilhada da prostituição, abre todas as perguntas e matiza todos os extremos.