Born in flames, 1983
Lizzie Borden
Estados Unidos

Por que a escolha?
A vitalidade do cinema contemporâneo reside, em grande parte, em sua capacidade de se nutrir de diferentes artes, de receber a influência de gêneros menores da literatura e, principalmente, de sua habilidade de amalgamar tradições cinematográficas que no passado existiam como compartimentos rígidos. Esse cinema costuma ser encontrado nas margens política, geográfica, econômica e simbólica. Os antecedentes desse cinema vivo podem ser encontrados justamente nos movimentos queer e experimentais. E não poderia ser de outra forma: só uma estética que procura superar o binarismo e que se preocupa em encontrar linguagens condizentes com um mundo novo poderia ter imaginado um cinema assim. O visionário Born in Flames, pertence a essa tradição.
Este trabalho já imprescindível é uma fantasia documental de ficção científica que mistura as tradições do teatro de vanguarda, da performance, do cinema direto, da televisão, do rádio, dos filmes caseiros e da ação política direta, amalgamando-as em uma linguagem cinematográfica nova e utópica. O filme narra um futuro em que os Estados Unidos são governados por uma democracia socialista, após uma revolução pacífica. O paradoxo é que, mesmo não existindo mais a proverbial tradição capitalista do país, mantêm-se as mesmas condições de exploração baseadas em classe, raça e gênero, sustentadas por um regime apoiado na brutalidade policial.
Esse é um filme incendiário. Não porque conclame à violência, mas porque nele aparece um dos significados que Didi-Huberman dá à imagem que arde. A que queima porque mobiliza as forças políticas que o poder dominante quer manter apaziguadas. Aqui a imagem que arde é a de um mundo onde o poder tropeça numa utópica união transversal dos diversos movimentos de mulheres.
Ficha técnica