Por que a escolha?

Uma jovem de vestido azul claro caminha alegremente pela rua com uma enorme flor tropical colorida de haste longa na mão. Seu sorriso e seu andar leve e despreocupado contrastam com o ato subversivo que ela está prestes a cometer. Ao passar pelos carros estacionados, ela bate a flor nas janelas, estilhaçando-as a cada golpe. A obra em questão é Ever Is Over All, da artista suíça Pipilotti Rist, apresentada na Bienal de Veneza de 1997: uma explosão irreverente de cores que remete à ideia de que as mulheres são proibidas de expressar ira e frustração, assim como de exercer violência, privilégios tradicionalmente reservados aos homens.

Ao mostrar uma mulher exercendo uma forma de violência simbólica, a artista subverte essa norma e resgata o direito à expressão plena, usando a raiva como resposta a um sistema que silenciou e oprimiu as mulheres durante séculos. Esse gesto viola o mandato de "bom comportamento" imposto às mulheres desde pequenas e por diversas instituições sociais. A flor, aparentemente frágil e delicada, aqui se torna um instrumento de força e destruição, simbolizando a dualidade da raiva: uma força que pode ser tanto destrutiva quanto criativa, capaz de derrubar estruturas opressivas e abrir caminhos.

A combinação de fantasia urbana violenta, música romântica e sons de destruição mostra uma transgressão transformada em imagem em movimento. Rist consegue capturar um ato de rebelião com humor e ironia, transformando a destruição em um grito eufórico de liberdade. Sob a ordem patriarcal do Ocidente, a violência exercida pela protagonista não é gratuita, mas um exemplo de que as mulheres também podem sentir e expressar a ampla gama de emoções humanas. Como Pipilotti Rist nos lembra, junto com outras artistas como Valie Export e Artemisia Gentileschi, quando a injustiça acontece, a expressão da ira das mulheres se torna catártica e inspiradora. Com suas imagens, Rist questiona os papéis de gênero e expande as possibilidades de expressão das mulheres, resgatando para todas a potência da raiva e da rebelião.