Por que a escolha?

A figura do chefe da máfia que, desde a década de 1970, está associada aos chefes do narcotráfico latino-americano e ao tráfico ilegal de drogas nos Estados Unidos e na Europa, dá continuidade à longa tradição do mito patriarcal do bandido-herói: o homem fora da lei e aventureiro que goza de admiração popular, por mais sanguinário que seja (ou talvez, em parte, por essa razão), e que encarna as aspirações e fantasias das camadas sociais tradicionalmente espoliadas. Homens que, como Odiseo, enfrentam os deuses – neste caso, as elites políticas e econômicas – através do engano e da violência, e que colhem as recompensas das suas façanhas com os sinais de distinção típicos dos patriarcas: mulheres, prole, bens e pessoas devedoras de sua generosidade. A devoção por esses personagens é tão grande que, em muitos casos, ao serem abatidos, eles são elevados à condição de santos populares.

Em seu romance Papi, a dominicana Rita Indiana (1977) combina essa forma de adoração com outra que também vem da cultura patriarcal: a idealização feminina do pai. Por isso, neste livro não vemos a violência concreta sobre a qual o mafioso constrói seu poder, mas sim, ao ser retratado por uma menina que está entrando na adolescência, ele nos é mostrado como um ser fantástico e mais parecido com um messias benevolente, idolatrado pelos homens e amado pelas mulheres.

O pai de Indiana é onipresente e onipotente: ele faz todo tipo de milagres e realiza os desejos mais abjetos. “Os poderes do papai florescem quando o espírito de quem deseja vibra ao máximo”, diz a menina quando ele já virou santo (três balas como os pregos de Cristo, segundo sua mãe) e ela vira apóstola de seu poder na terra, aguardando sua volta do mundo dos mortos. Porque, aconteça o que acontecer, ela estará sempre esperando o pai; ela não parou de fazer isso desde que ele prometeu que a levaria à praia. Enquanto isso, ela vai crescendo, e o fantasma do pai é finalmente enterrado com o abraço materno.